21.2.09

. conversa de salão .

Hoje, no Athena, o assunto "etiqueta"ocupou nossa pauta, entre luzes, escovas definitivas, pés e mãos. Etiqueta, literalmente poderia ser definida como "pequena ética", ou ética nas pequenas coisas, nos nossos relacionamentos diários. Como se vê, o assunto "deu pano prá manga", como diziam nossas avós.
Falamos de como nossos companheiros não nos ouvem e de como poderíamos ser mais objetivas até mesmo na hora de "discutir a relação" se é que ainda vale a pena discutí-la.
Falamos da cordialidade, da caridade e da generosidade, princípios tão esquecidos em nosso dia-a-dia e em como a vida seria mais leve se atentássemos para eles.
Falamos também sobre o quanto é ridículo fazer doze dias de rodeio e cantorias se não está claro de onde vem o dinheiro.
Houve até a proposta de obrigar o prefeito e os secretários municipais a fazer um curso intensivo de etiqueta...

Para minhas amigas clientes proponho o grande poeta, escritor e dramaturgo alemão Bertold Brecht:


O Analfabeto Político
"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo."


As Boas Ações
Esmagar sempre o próximo não acaba por cansar?
Invejar provoca um esforço que incha as veias da fronte.
A mão que se estende naturalmente dá e recebe com a mesma facilidade.
Mas a mão que agarra com avidez rapidamente endurece.
Ah! que delicioso é dar!
Ser generoso: que bela tentação!
Uma boa palavra brota suavemente como um suspiro de felicidade!

15.2.09

. compaixão .

Minha geração, adolescente e jovem nos anos 60-70 sabe bem o que significa o dia de hoje:
_ Chegamos à Era de Aquarius. Entramos hoje, dizem os astrólogos. Palavra de ordem? COMPAIXÃO. Compaixão no sentido exato: sentir junto.
Registro aqui texto do Leonardo Boff, companheiro de caminhada rumo aos sonhos, às utopias:

"Hoje nos encontramos numa fase nova na humanidade. Todos estamos regressando à Casa Comum, à Terra: os povos, as sociedades, as culturas e as religiões. Todos trocamos experiências e valores. Todos nos enriquecemos e nos completamos mutuamente. Vamos rir, chorar e aprender. Aprender especialmente como casar Céu e Terra, como combinar o cotidiano com o surpreendente, a imanência opaca dos dias com a transcendência radiosa do espírito, a vida na plena liberdade com a morte simbolizada como um unir-se com os ancestrais, a felicidade discreta neste mundo com a grande promessa na eternidade. E, ao final, teremos descoberto mil razões para viver mais e melhor, todos juntos, como uma grande família, na mesma Aldeia Comum, generosa e bela: o planeta Terra."

3.2.09

. Insanidade .

Postei logo abaixo a bela poesia de Machado de Assis, "A Mosca Azul", inspirada numa lenda milenar em que um servo de um palácio oriental foi mordido por uma mosca azul e ficou tão inebriado que viu seu rosto refletido naquele azul da mosca e começou a imaginar-se Sultão.
A poesia nos diz que a mosca tinha asas de ouro e granada e refulgia ao clarão do sol e da lua...
Que aquele homem rude ficou a contemplá-la, deslembrado de tudo-sem comparar nem refletir... imaginando jóias, mulheres, glória, 14 reis vencidos... Ficou tão deslumbrado que quiz vê-la, saber a causa do mistério... Quando a viu rota, baça, nojenta e vil, esvaiu-se aquela visão fantástica e sutil.
Frei Betto, com toda sua bagagem cultural, escreveu um livro com o mesmo nome, onde faz paralelo com a lenda e o exercício do poder, em que pessoas, uma vez embevecidas, acreditam que são muito mais do que realmente são. Vale a pena ler o capítulo "Espelho, espelho meu, existe alguém com mais poder do que eu?"

PS. Tudo isto me faz pensar que o pessoal da "eficiência" e da eugenia, uma vez picado pela mosca azul, sucumbiu inebriado ao "Tudo será teu se me adorares".

1.2.09

. 25 de janeiro .

Entre as tristes notícias da nossa cidade, se faz necessário lembrar que há 25 anos, no dia 25 de Janeiro, teve início o maior movimento popular brasileiro, com o comício histórico da Praça da Sé que exigia eleições diretas para presidente: Diretas-Já.
Em abril de 1984, um ano depois, a Emenda Dante de Oliveira foi rejeitada no Congresso Nacional, numa vergonhosa manobra.
Diz a física que a toda ação corresponde uma reação.
O texto a seguir, do jornalista Ricardo Kotscho, retrata o estado de espírito da nossa nação, naquele momento político:

"Faltaram apenas 22 votos para a aprovação da Emenda Dante de Oliveira, que previa a volta das eleições diretas para presidente e precisava de maioria de dois terços no Congresso Nacional, naquela triste madrugada de 25 para 26 de abril de 1984.

Pelo chão acarpetado do plenário da Câmara Federal, quando tudo acabou, os representantes de um povo derrotado no seu maior anseio pisavam sobre as pétalas de crisântemos amarelos, que estes meses todos simbolizaram uma luta, um sonho, um encontro _ o grito de liberdade desta humilhada Nação brasileira.

Lá fora, depois das duas da manhã, algumas centenas de cidadãos ainda esperavam o impossível, uma reversão no resultado que ninguém queria: a esmagadora maioria dos 130 milhões de brasileiros arrasada pela ausência dos deputados do PDS (o partido do governo militar).

(…) Alguns deputados choravam, outros se prostravam em silêncio. Ao ser anunciado o resultado da votação da Emenda Dante de Oliveira, pouco depois das duas horas da manhã de ontem, a grande festa que todo o povo brasileiro esperava corria o risco de se transformar num imenso velório.

Mais uma vez, porém, este povo reagiu. Em vez de ficarem lamentando os 22 votos que faltaram para que o Brasil voltasse a ser uma democracia, os homens e as mulheres que lotavam as galerias bradaram seu grito de guerra: “Um, dois, três, quatro, cinco mil, queremos eleger o presidente do Brasil!”.

. A Mosca Azul .

Machado de Assis

Era uma mosca azul, asas de ouro e granada,
Filha da China ou do Indostão,
Que entre as folhas brotou de uma rosa encarnada,
Em certa noite de verão.

E zumbia, e voava, e voava, e zumbia,
Refulgindo ao clarão do sol
E da lua, - melhor do que refulgiria
Um brilhante do Grão-Mogol.

Um poleá que a viu, espantado e tristonho,
Um poleá lhe perguntou:
"Mosca, esse refulgir, que mais parece um sonho,
Dize, quem foi que to ensinou?

"Então ela, voando, e revoando, disse:
-"Eu sou a vida, eu sou a flor"
Das graças, o padrão da eterna meninice,
"E mais a glória, e mais o amor.

"E ele deixou-se estar a contemplá-la, mudo,
E tranqüilo, como um faquir,
Como alguém que ficou deslembrado de tudo,
Sem comparar, nem refletir.

Entre as asas do inseto, a voltear no espaço,
Uma cousa lhe pareceu
Que surdia, com todo o resplendor de um paço
E viu um rosto, que era o seu.

Era ele, era um rei, o rei de Cachemira,
Que tinha sobre o colo nu,
Um imenso colar de opala, e uma safira
Tirada ao corpo de Vichnu.

Cem mulheres em flor, cem nairas superfinas,
Aos pés dele, no liso chão,
Espreguiçam sorrindo, as suas graças finas,
E todo o amor que têm lhe dão.

Mudos, graves, de pé, cem etíopes feios,
Com grandes leques de avestruz,
Refrescam-lhes de manso os aromados seios,
Voluptuosamente nus.

Vinha a glória depois; - quatorze reis vencidos,
E enfim as páreas triunfais
De trezentas nações, e o parabéns unidos
Das coroas ocidentais.

Mas o melhor de tudo é que no rosto aberto
Das mulheres e dos varões,
Como em água que deixa o fundo descoberto,
Via limpo os corações.

Então ele, estendendo a mão calosa e tosca,
Afeita a só carpintejar,
Como um gesto pegou na fulgurante mosca,
Curioso de a examinar.

Quis vê-la, quis saber a causa do mistério.
E, fechando-a na mão, sorriu
De contente, ao pensar que ali tinha um império,
E para casa se partiu.

Alvoroçado chega, examina, e parece
Que se houve nessa ocupação
Miudamente, como um homem que quisesse
Dissecar a sua ilusão.

Dissecou-a, a tal ponto, e com tal arte, que ela,
Rota, baça, nojenta, vil,
Sucumbiu; e com isto esvaiu-se-lhe aquela
Visão fantástica e sutil.

Hoje, quando ele aí vai, de áloe e cardamomo
Na cabeça, com ar taful,
Dizem que ensandeceu, e que não sabe como
Perdeu a sua mosca azul.

(Ocidentais, in Poesias completas, 1901.)